segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Ando na rua olhando para os lados.Isso poderia ser entendido como uma ação comum que aprendemos quando somos crianças, mas não é.Não olho para ver se está passando um carro, o que eu não fiz esse final de semana e quase fui atropelada, mas ando para ver se há alguém suspeito capaz de cometer uma injúria contra minha pessoa e me transformar em mais um número no Jornal Nacional.E vivo assim, desde que entendi que existe uma possibilidade, e ela não é pequena, de ser afetada pela ação de terceiros que tem terceiras intenções como a  fome ou o vício,bem mais urgentes do que em passar no vestibular ou viajar para a Europa.Enquanto eu luto pelos desejos citados anteriormente, aparece uma voz na minha cabeça que diz que eles são muito fúteis, que eu sempre vivi muito bem, obrigado, e não sei o que é morar na rua ou ter que abrir mão do meu corpo em troca de umas migalhas, não sei o que é dormir no esgoto, catar lixo para comer, apanhar da polícia sem ter como me defender, perder meu senso de humanidade para continuar a sobreviver.E ai ,eu me sinto pior do que o lixo..

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Fugir é para os fracos ,diria meu irmão.Porém, há certos momentos que a fuga é a saída mais difícil e você deve mostrar muita coragem para sair andando sem olhar para trás.
Há várias contradições na vida, pessoas que não querem lutar e outras que não querem parar de lutar. Qual delas está errada? Qual se sente pior? Who knows? O que interessa é que elas não encontram um meio termo, não sabem sair do lugar que são sentadas e isso consome energia, tempo, felicidade.
Se fugir é ruim imagine-se olhando o mesmo rosto a vida toda e desejar ser diferente ,cortar o cabelo ,fazer a barba, viajar, conversar mas continuar ali parado , só pensando sem agir ,sem fugir, sem lutar , sem parar de lutar contra si mesmo e continuar ali, fixo.
Fugir não significa pegar o passaporte e voar para a Austrália nem tão pouco criar uma nova identidade para viver uma nova vida ,esquecendo-se dos problemas familiares ,financeiros , conjugais...  Pelo contrário, significa o tempo que uma pessoa precisa para se equilibrar e encarar tudo e todos de forma mais racional e eficiente.Claro que existem pessoas que podem fazer dessa fuga uma das melhores férias de sua vida, mas quem não tem todo esse poder pode achar em uma música ou um passeio à praia forças para continuar.
Fugir não é esquecer , é lembrar.Lembrar  que seres humanos não nasceram em uma sociedade descontroladamente confusa , cheia de obrigações como a nossa  e não tinham ,o que convencionamos chamar, de tempo.Para eles a vida era simples e fugir, uma questão de sobrevivência. Aproveite que não há animais ferozes nos perseguindo.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Sessão metalinguagem




Ai, palavras, ai, palavras,
que estranha potência, a vossa!
ai, palavras, ai, palavras,
sois de vento, ides no vento,
no vento que não retorna,
e, em tão rápida existência,
tudo se forma e transforma!

Sois de vento, ides no vento,
e quedais, com sorte nova!

Ai, palavras, ai, palavras,
que estranha potência, a vossa!
todo o sentido da vida
principia à vossa porta;
o mel do amor cristaliza
seu perfume em vossa rosa;
sois o sonho e sois a audácia,
calúnia, fúria, derrota...

A liberdade das almas,
ai! com letras se elabora...
E dos venenos humanos
sois a mais fina retorta:
frágil, frágil como o vidro
e mais que o aço poderosa!
Reis, impérios, povos, tempos,
pelo vosso impulso rodam...

Detrás de grossas paredes,
de leve, quem vos desfolha?
Pareceis de tênue seda,
sem peso de ação nem de hora...
- e estais no bico das penas,
e estais na tinta que as molha,
e estais nas mãos dos juizes,
e sois o ferro que arrocha,
e sois barco para o exílio,
e sois Moçambique e Angola!

Ai, palavras, ai, palavras,
íeis pela estrada afora,
erguendo asas muito incertas,
entre verdade e galhofa,
desejos do tempo inquieto,
promessas que o mundo sopra...

Ai, palavras, ai, palavras,
mirai-vos: que sois, agora?
- Acusações, sentinelas,
bacamarte, algema, escolta;
- o olho ardente da perfídia,
a velar, na noite morta;
- a umidade dos presídios,
- a solidão pavorosa;
- duro ferro de perguntas,
com sangue em cada resposta;
- e a sentença que caminha,
- e a esperança que não volta,
- e o coração que vacila,
- e o castigo que galopa...

Ai, palavras, ai, palavras,
que estranha potência, a vossa!
Perdão podíeis ter sido!
- sois madeira que se corta,
- sois vinte degraus de escada,
- sois um pedaço de corda...
- sois povo pelas janelas,
cortejo, bandeiras, tropa...

Ai, palavras, ai, palavras,
que estranha potência, a vossa!
Éreis um sopro na aragem...
- sois um homem que se enforca!